A esperança é minha emoção positiva preferida. Isso porque ela é especial: diferente de todas as outras emoções positivas, ela é a única que floresce num ambiente negativo. Não apenas isso, a esperança precisa da adversidade para florescer, pois é apenas quando as coisas não vão bem que ela pode existir. E isso, em termos de emoções positivas, a torna singular.
Neste sentido, a esperança é também muito poderosa, pois é capaz de virar o curso de uma maré e reverter a forma como nos sentimos frente a uma situação, dando forças para seguir em frente com a promessa de que algo pode ser diferente.
A esperança sempre renova uma promessa.
Mas, quando levada ao extremo, essa emoção positiva pode também assumir um aspecto patológico. Isso porque a esperança pode renovar os votos com o que te faz mal. Pode perpetuar, por vezes de modo indeterminado, um padrão nocivo. A esperança também pode impedir de agir – e esse, podemos argumentar, pode ser seu ganho secundário.
A esperança patológica, vista como uma forma de ganho secundário, pode servir como uma defesa frente a uma importante decisão. Numa relação abusiva, ela pode protelar um término doloroso e, portanto, poupar desses dias difíceis.
Ah, mas um dia ele(a) vai mudar! Foi só dessa vez! Só mais essa vez! E mais essa e mais essa… mas ele(a) vai mudar! Mas seu eu fizer mais um pouco…
É claro que, nesse tipo de relacionamento, a esperança é comumente alimentada por aquele que busca domínio sobre o outro. Isso ocorre por meio de promessas que se renovam a cada vez que uma crise se instala de modo a semear esperança de um futuro diferente. Mas a mudança, claro, quase nunca acontece – salvo os casos em que realmente há a busca por algum tipo de tratamento.
Presa nessa armadilha, uma pessoa que esteja sendo vítima de uma relação abusiva pode também estar vivendo ecos de seus próprios temas psicológicos sem que se dê conta disso. É o caso de quem pensa demasiadamente no outro a ponto de se perder de si, um padrão que costuma vir desde a infância.
Agradar o outro a todo custo ou, pelo menos, não desagradar, costuma ser lei nesse tipo de perfil. Mesmo que a justificativa seja ser uma boa pessoa e que isso não inclua, num primeiro olhar, o outro, a tendência aqui é se doar ao extremo com a esperança de que, algum dia, esse sacrifício seja suficiente para agradar o outro ou finalmente fazê-lo reconhecer tudo o que foi feito, num momento mágico e extasiante que nunca se realiza a não ser em sonho.
É possível também que a pessoa simplesmente não se sinta boa o bastante e, por isso, se sinta incapaz de agir, já que tomar uma decisão vai sempre significar algum risco e algum julgamento, mesmo que seja de si para si. Ou então carregue alguma culpa, às vezes inconsciente e muito antiga, mas que torna a possibilidade de decisão sempre muito pesada e algo a ser evitado a todo custo, às vezes de uma vida inteira.
A esperança, portanto, pode ser paralisadora.
Ela pode operar como uma espécie de liga que não deixa seguir em frente, mas que prende numa estagnação sem fim, onde nunca uma atitude é tomada e então colocar seu portador numa espécie de vivência em modo passivo onde, inevitavelmente, acabará como vítima do outro ou das circunstâncias.
A tomada de decisão é um fator crucial para quem deseja se livrar de uma relação abusiva. Nesse caminho, a esperança patológica pode ser um poderoso obstáculo. Para dissolvê-lo, um mergulho profundo em si mesmo vai se fazer necessário a fim de mapear as exatas razões pelas quais ela se instalou, tanto as externas quanto as internas.